CONSCIÊNCIA NEGRA PARA QUEM?



O mês de novembro está chegando ao fim e com ele as comemorações da consciência negra. Em todos os lugares do Brasil  se festeja a consciência negra e se lembra de Zumbi dos Palmares, morto num dia 20 de novembro de 1695 na Serra Dois Irmãos em seu grandioso quilombo, os Palmares. Ao contrário do que se decanta, os Palmares foi local de abrigo também para  mestiços, brancos pobres e índios  explorados pelo colonizador poderoso e impiedoso que tratava o subalterno como animal.

Ainda no século XVII, o negro já lutava por respeito e humanização de sua etnia no Brasil, por isso Zumbi morreu e com sua morte ficavam dois símbolos no Brasil: o primeiro a luta pela sobrevivência e o respeito às pessoas de cor negra; o segundo a teimosia do branco ou quase branco em querer submeter e desqualificar seus irmãos de cor.

Após séculos de luta por respeito e sobrevivência, o negro conseguiu no Brasil algumas prerrogativas para se encaixar na sociedade de maneira mais respeitável. Essas vieram sempre por obrigatoriedade, imposição do Estado. Até o inicio dos anos 2000, nas novelas os negros só faziam papeis de escravos e ou empregados domésticos. Na atualidade como protagonistas de novelas e afins, só a Thais Araújo, negra linda e rica, e a Camila Pitanga que sempre começa bem pobre, desarrumada e sofrendo algum preconceito para depois se ajeitar, entre os homens só lembro do Lázaro Ramos. 

Nas lojas dos shoppings só encontrávamos vendedoras(res) branquinho ou quase brancos, bem vestidos e ou maquiadas; nas faculdades, principalmente nos cursos de medicina, direito e afins entre 50 alunos, no máximo três eram negros e nas escolas particulares as proporções eram as mesmas. Concursos de beleza para ter uma miss negra tinha que ser nos países negros. No Brasil, só me lembro de uma miss negra, a gaúcha Deise Nunes eleita em 1986. Modelos negras famosas no Brasil, não conheço. Apresentadoras de programas infantil, também não.

O futebol é o lugar que mais revela homem negro, porém eles pagam um preço alto, são chamados de “macacos” pelo Brasil e pelo mundo. Em pleno século XXI, brancos ou quase brancos ainda pensam que são mais importantes que seus irmãos de cor. Os jogadores negros e ricos, de repente ficam “brancos”. O Pelé, o Neymar, são homens “branquinhos” para a sociedade clarinha e interesseira. O Liédson, tão bajulado pelos brancos do meu lugar, se estivesse jogando num time local, ninguém o enxergaria, como era antes e como é com os outros. Se eu perguntar aos “amigos” do Liédson quem é “Rafael” jogador de futebol da cidade ninguém saberá responder, mas, se ele for para um Flamengo da vida...


A consciência do negro garante a defesa do subalterno e seu lugar no mundo enquanto pessoa igual na sociedade. Sua luta nesses mais de quatro séculos por respeito e cidadania vem gerando possibilidades e garantias para a sobrevivência das pessoas que têm a pele escura e principalmente do pobre de modo geral, pois os Palmares sobrevivem nas populações pobres sem distinção de cor.

 Para ser negro basta ser pobre, o olhar é o mesmo. A luta de Zumbi permaneceu na sociedade brasileira e a passo de formiga, foram criadas algumas  leis para garantir alguns direitos. As cotas garantiram aos pobres (negros) o direito de entrar para uma universidade e se igualar aos quase brancos em conhecimento, e conquistarem as mesmas oportunidades. Mas para que isso acontecesse, foi preciso se criar outras cotas, as vagas nos concursos para negros e deficientes. No Brasil é assim, para incluir o negro é preciso que haja a obrigatoriedade.

Para quem serviria a “consciência negra” para os próprios negros que tem muita consciência de quem são ou para os quase brancos que insistem em se pensarem superiores? Em 2015, assistimos nos jornais negros sendo mortos em blitz policiais sem sequer serem abordados antes; vemos pessoas serem chamadas de macacos por micos que não se reconhecem enquanto etnia miscigenada com resquícios de negritude e sangue indígena em todos os poros; vemos negros que não se reconhecem dizendo que as cotas criaram o racismo no Brasil.
Em vários Estados brasileiros já é feriado no dia 20 de novembro, na Bahia, segundo estado mais negro do mundo é um dia comum. Em Valença, uma militante negra realiza uma caminhada carregando todos os símbolos da negritude pelas ruas e para não ser diferente há sempre alguém contrariado para dizer que não é necessário levar “santos” para as praças. Mas os santos fazem parte da cultura negra, como fazer uma caminhada em referência ao negro e não levar suas manifestações culturais?

A caminhada da Consciência Negra é sempre muito bonita, a organizadora Célia Praesent está de parabéns com o seu trabalho de conscientização e de luta pela preservação dos costumes do negro num país de população mista onde boa parte é negra e a minoria é  quase branca mas por falta de consciência insiste em tentar “apagar” ou desqualificar seus irmãos para se garantirem como “donos” de uma sociedade mista, colorida e um pouco cega!
                                                                       Nov. 2015

Comentários

Chico Nascimento disse…
Rica exposição com referências históricas que balizam a nossa luta diária por igualdade de oportunidades e justiça no tratamento social! Parabéns Irene Doris!

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